De acordo com os estudos realizados no país, em média, uma em cada cinco meninas revelou ter faltado à escola por causa da menstruação, durante o último ano.
Em Angola 75% das raparigas frequentam o ensino primário, este número cai para 15,5% no ensino secundário, quando a média das raparigas têm o seu primeiro período menstrual, sendo a falta de acesso adequado a produtos de higiene íntima, um dos principais factores às altas taxas de abandono escolar.
Parceiros institucionais do UNFPA em Angola, de vários sectores do Governo e da Sociedade Civil distribuíram, entre Dezembro do ano passado e Janeiro último, 2000 calcinhas de menstruação e 2000 relógios menstruais a jovens de Luanda, Huambo, Lunda Sul e Huíla. Os materiais foram doados durante palestras sobre higiene menstrual, onde 27 formadores das Organizações Parceiras capacitados pela organização Be Girl, transmitiram também a importância de acabar com mitos, tabus e preconceitos à volta do tema, partilhando materiais educativos e utilizando o método educacional baseado em Ciclos de Empatia, que permitiu aos adolescentes perceber melhor o ciclo menstrual, rumo à equidade de género. O projecto “Ser Menina em Angola” avança agora para mais três províncias (Cuanza Sul, Benguela e Moxico).
Natércia Feliciano é uma adolescente moradora do distrito do Rangel, em Luanda, no seu bairro ela e outras meninas tinham muita dificuldade de acesso aos produtos de higiene íntima. Agora, a voz da Natércia é alegre. Com 12 anos, a estudante da 6ª classe entende melhor as mudanças aceleradas do seu corpo. Se antes a menstruação era um bicho de sete cabeças, depois de participar nas palestras facilitadas pelos formadores das instituições do Governo e Sociedade Civil parceiras do UNFPA, as dúvidas dissiparam-se. “Nessas conversas aprendi muita coisa que não sabia. Aprendi o que é a puberdade, a ovulação, a menstruação ou a menstruação irregular”, conta a menina. As duas cuequinhas de menstruação da ``Be Girl” que recebeu transformaram-lhe a vida, “agora sinto-me muito bem”, assegura a adolescente.
Com a segurança de quem sabe do que fala, a jovem Januária Lourenço Felipe, de 14 anos, também conta que passar pela menstruação é agora muito menos complicado. “Antes das palestras eu não conseguia fazer muitas coisas, como educação física, e sentia-me aflita quando conversava com os rapazes. Mas agora é muito diferente, quando menstruo já consigo fazer exercício e ter contacto normal com os meninos”. Decidida e firme, apenas faz um pedido: “Gostei muito da cuequinha da Be Girl, mas há meninas com o corpo mais cheio a quem não lhes serviu, por isso tem que haver números maiores e mais pequenos, porque todos os corpos são diferentes”.
Januária faz parte da percentagem importante de meninas, dos 86%, que passaram a entender a relação entre menstruação e reprodução durante as sessões.
Entre as mil meninas com idades entre 10 a 16 anos que participaram nas 47 palestras nas províncias de Luanda, Huambo, Lunda Sul e Huíla, os técnicos identificaram casos de risco e de gravidezes precoces. Realidades difíceis que reforçam a importância das adolescentes conhecerem o próprio corpo.
Em Angola, 57% das mulheres com idades compreendidas entre os 15 e 19 anos, que não concluíram nenhum nível de escolaridade, já iniciaram a sua vida reprodutiva, o que é mais do dobro das mulheres com ensino secundário e superior (24,8%).
Criando Ciclos de Enpatia
Na primeira fase do programa, mil adolescentes do sexo masculino participaram nas palestras “Criando Ciclos de Empatia”. A par destas sessões com raparigas e rapazes, o programa “Ser Menina em Angola” trabalha na recolha de dados que permita conhecer melhor a percepção de jovens de todo o país sobre a menstruação. Através da iniciativa SMS Jovem, o programa lançou o “Inquérito sobre Saúde Menstrual”. As mais de 4328 respostas recebidas de todo o país, sobretudo Luanda, Huambo e Huíla, demonstram que 83% das jovens adolescentes participantes sabiam pouco ou nada sobre o ciclo menstrual, antes da sua primeira menstruação. Hoje a maioria sente-se já confortável com o tema, considerando-o algo normal. Ainda assim, quase 80% das participantes, a maioria raparigas entre os 15 e 30 anos, admitem que há actividades que têm que deixar de lado durante essa altura do mês. 41% confirmam que tiveram que faltar à escola no último ano devido à menstruação.
Estas respostas vindas de todo o país, serão essenciais para o “Ser Menina em Angola” definir a sua estratégia para a próxima fase, que já está em marcha. Ainda este ano, deverá estender-se a mais três províncias - Cuanza Sul, Benguela e Moxico - com o Zaire e Malange na mira para uma próxima etapa. No total, pretende alcançar 2000 meninas e 2000 rapazes com materiais de higiene e gestão da saúde menstrual (4000 cuequinhas a meninas e 4000 smartcycle a meninas e meninos), utilizando o mesmo formato e método educativo da iniciativa piloto. Um novo grupo de formadores estará também a ser capacitado.
O programa já provocou o interesse do Ministério da Juventude e Desportos para a manufactura de materiais reutilizáveis no nosso país. A maior disponibilidade de produtos recicláveis e de baixo custo dariam uma contribuição gigantesca à gestão da higiene e saúde menstrual de meninas e adolescentes, principalmente aquelas que se encontram em contextos sociais mais frágeis. Ao mesmo tempo, aposta-se na advocacia de alto nível para a isenção de impostos sobre produtos e materiais menstruais e estabelecimento de parcerias estratégicas para a inclusão da iniciativa dentro e fora das escolas.
Projecto Saúde Menstrual em Angola - principais resultados/ Menstrual Health in Angola - key results